quarta-feira, 25 de julho de 2018

A primeira brasileira a tirar carteira de motorista na Arábia Saudita!

Ou até que me corrijam, sou a primeira brasileira a tirar a carteira de motorista aqui na Arábia Saudita! Isso segundo os meus Institutos de Pesquisas Gabrielísticos. Mashallah!



Pois é, hoje acordei bem cedinho, o sorriso de orelha a orelha, um pouquinho de nervosismo porque é inevitável, e lá fomos nós até Jubail, a uma hora de carro de onde eu moro, Al Khobar, para finalmente me habilitar sauditamente.

Por que Jubail? Porque os horários de agendamento da polícia mais perto da minha cidade, Damman, está com lista de espera de quase dois meses! Está todo mundo querendo dirigir por aqui.

Chegamos lá no meu horário marcado, em ponto as 8 da manhã, mas, como estamos na Arábia Saudita, o mocinho só começou a atender a gente as 8:30.
Durante a espera, mais uma moça saudita e seu pai chegaram. O pai dela, todo trajado de árabe, já meio de idade, olhou pra mim e sorriu: até ele podia sentir a alegria em que estávamos.

O processo lá na polícia foi um pouco confuso. Um carimbo aqui, espera um pouco lá, um outro árabe que estava por perto perguntou se a gente precisava de alguma ajuda com a tradução, achei legal, o povo estava simpático.
Então começaram a atender as mulheres, que estávamos aguardando pacientemente na área de espera feminina.



Mal dei dois passos na sala e um oficial carrancudo já falou meio seco:
- Documento e carteira de motorista originais.

Bom dia pro senhor também pensei, já receosa de que minha euforia iria murchar por conta dele. Ou que ele ia achar algum motivo de me barrar. Ou que faltava algum documento. Sei lá.

Ele me entregou mais um formulário em árabe, e "traduziu" os dados que ele queria que eu preenchesse.
Obviamente que de uma sala até a outra eu esqueci o que tinha que colocar em cada campo, mas o senhorzinho árabe que estava aguardando a filha nos ajudou.
Enfim, entreguei tudo pro "seu moço", que deu o carimbaço, e lá fui eu seguindo outro oficial para o pátio fazer o teste.

Nisso as outras mulheres que chegaram depois de mim já estavam se encaminhando pra lá também: uma que parecia americana e estava de chinelo (se passou eu não sei) e mais outras duas árabes.

Primeiro de tudo o policial perguntou algo em árabe, e a mocinha traduziu pra mim:
- Você entende árabe?

Eu respondi mentalmente: lóooogico... que não. Mas sei esquerda e direita tá.
Então a mocinha começou a traduzir o que ele dizia: na verdade as coisas bem básicas do que ia ser avaliado no teste:
Colocar o cinto, dar a seta. fazer a querida baliza e uma curva.
Ele deu a primeira volta pra mostrar pra gente, e em seguida lá fui eu.

Gente, que coisa mais boba aquele teste! Pra quem já dirigiu em pista de corrida, aquilo era bobagem. Mas pressão era inevitavel: já imaginou não passar? A mão suou, acho que mais pelo calor do que pelo nervosismo. Aquele teste passou em camera lenta na minha cabeça.
Mas foi como deveria ser, super tranquilo. Dei a voltinha que precisava dar, ganhei  assinatura que precisava e volta Gabi pra dentro.

Eis que chego na sala e um outro oficial estava lá agora, um rapazinho novo, que me recebeu com um sorriso. Entreguei os papeis, ele recebeu e falou, olhando pra baixo, digitando no computador:
- Você não passou no teste.
E eu:
- Ué, fiz tudo certinho.
- O homem lá fora não te falou? - E deu risada.

Engraçadinho, pra quem acha que árabe é todo sério, não é não. Aquela cara carrancuda que muitos fazem é mais por causa do calor mesmo.

Depois dessa piadinha, ele perguntou de onde eu era. E nessas horas que eu agradeço ao Neymar, ao "Ronaldíneo", ao Roberto Carlos, porque o Brasil e o brasileiro tem uma imagem boa aqui na Arábia Saudita. Eles sempre abrem o sorriso e começam a falar de futebol quando dizemos que somos brasileiros.


Depois de aguardar mais um pouquinho, lá saía eu com o sorriso maior ainda e a carteira de motorista saudita, ainda quentinha da impressora, na mão.

Meu marido precisava voltar ao trabalho, então propus: te deixo no trabalho e fico com o carro pra ir pro meu. Como ele é maravilhoso e não tem medo do perigo, aceitou na hora. Ele confia na pessoa que tem ;)

Confesso que tive um pouco de medo. Não é a primeira vez que dirijo, nem que nunca tenha dirigido em trânsito pesado ou rodovia na vida, mas é que o trânsito da Arábia Saudita é uma terra sem lei e sem juízo. É muito louco. É violento. É preciso estar atento e estar atento na sua atenção ainda.
A lei é a do mais corajoso.

Via preferencial? Quem está na rotatória é que tem a vez? Quem me dera! Vai primeiro quem tem menos medo de morrer. Seta? Faz me rir. Ninguém avisa pra onde vai virar. Você tem que adivinhar o que o cara da frente vai fazer, e quase sempre ele muda de idéia em cima da hora.


Mas sabe de uma coisa? O trânsito flui. Anda rápido. São muitas pistas. Foi divertido passar pelas ruas que antes eu só via do banco do carona, dessa vez com a mão na direção.

E eu vivi várias emoções em só algumas horas no carro. Gentileza de alguns, má educação de outros. Me cortaram a frente, um maluco dirigindo na contra-mão. Ou ver que algumas manobras foram muito mais fáceis do que imaginava, dirigir com confiança hora do rush saudita. Dar carona pra colega e dar uma folga pro motorista da academia. Não achar estacionamento e ter que caminhar no sol de 42 graus porque a única vaga era longe. (Saudade do motorista que me deixava na porta... brincadeira)
Não senti nada quanto aos outros motoristas, de ficarem olhando ou coisa parecida. Parecia algo normal... E é isso que tem que ser!
Exceto por uma criancinha que ficou olhando com os olhos arregalados da traseira de um carro.
E por fim errar o caminho sem querer, mas no fundo querendo, só pra poder dirigir mais um pouco antes de buscar o marido no trabalho. Que veio com um colega saudita que queria me dar parabéns pela carteira (ou porque queria ver mesmo que meu marido me deixou com o carro).

Foi um dia muito louco e agora, à noite, quando paro pra escrever fico pensando: louco mesmo. Pra você que ta lendo e deve estar pensando: nossa quanta besteira, quanta animação por algo que eu faço todo dia. Espere só até passar essa alegria e você vai ver que é só estresse.
Ou, credo, que país horrivel, que só oprime as mulheres, ao ponto delas ficarem esse tanto de feliz só porque vão dirigir.

Mas é muito maior do que isso. É uma sensação, um sentimento de estar vivendo uma mudança na sociedade de um do países mais rigorosos do mundo, onde a religião, totalmente contrária ao que nós mulheres temos como certo, é o que rege as leis e a vida dos que vivem aqui.


É algo tão pequeno pra quem tem isso todos os dias, mas algo tão grande pra gente que não tinha esse direito antes. Foi algo que abri mão (da minha liberdade de me dirigir pra onde quisesse sem depender de niguém) quando decidimos vir pra cá, e agora, como um presente, não será mais uma barreira. Já saiu da lista das coisas que eu não gosto de morar aqui.

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Quer saber como transferir sua carteira de motorista para a saudita? Clica aqui -> Passo a passo para a carteira de motorista saudita





6 comentários:

  1. Show Gabi, adorei tua experiência, e como tenho uma boa ideia de como as coisas são por ai, parabéns pelo empenho e pela motivação de estar fazendo tudo isso. Um grande abraço pra vocês!

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    1. Obrigada! Camilo que me puxou pra fazer. Abração pra você!

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  2. Oie... cheguei no seu blog por acaso, procurando curiosidades da arabia saudita, que legal sua experiência, gostaria de saber sobre as pessoas.. como elas são? carrancudas? alegres? agressivas? ... obrigada!

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  3. Gabriela, boa tarde. Preciso muito falar com você. Estou prestes a ir para Jedahh e confesso estar um pouco apreensiva.como faço pra falar contigo? Quer meu Whatsapp? Mto obrigada.

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  4. Adorei seu relato!!! Realmente essa sensação que você deve ter experimentado não tem preço. A liberdade que vem com ela e tudo mais. Adorei seu blog. Não conhecia (conheci pelo Brasileiras pelo mundo). E estou adorando ler.
    Em breve irei trocar minha CNH brasileira pela finlandesa, mas ainda não sei ao certo como farei. Quase nunca tive acesso a carro e quase nunca dirigi. Aqui é muito mais tranquilo que em São Paulo, o que me deixa um pouco mais aliviada. Sou um pouco medrosa como motorista :/

    Um beijo!!!

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  5. Olá mt legal o blog; recebi uma proposta de emprego pra Arábia saudita e estou buscando mais informações a respeito!

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